quinta-feira, 18 de junho de 2015

Butão: O Obscuro Segredo para a Felicidade

Cidadãos de um dos países mais felizes na Terra são surpreendentemente confortáveis em contemplar um tópico que muitos preferem evitar. É esta a chave para a alegria?

por Eric Weiner

Em visita a Thimphu, capital de Butão, estive sentado diante de um homem chamado Karma Ura, derramando minhas tripas. Talvez fosse o fato de que seu nome é Karma, ou então o ar puro, ou o caminho da viagem que embrulha o estômago, mas eu decidi confessar algo muito pessoal. Não muito antes, do nada, experimentei sintomas desconfortáveis: respiração curta, tontura, formigamento nas mãos e nos pés. Em primeiro lugar, temi estar tendo um ataque cardíaco ou ficando louco. Talvez ambos. Então fui ao médico, que fez vários exames e descobriu que...

"Nada", disse Ura. Ainda antes que eu pudesse completar minha frase ele soube que meus medos não tinham fundamento. Eu não estava morrendo, pelo menos não tão rápido como eu temia. Eu estava tendo um ataque de pânico.

O que eu queria saber era: por que agora - minha vida estava indo incomumente bem - e o que eu poderia fazer em relação a isto?

"Você precisa pensar sobre a morte por cinco minutos ao dia", respondeu Ura. "Isto te curará".

"Como?", eu disse, estupefato.

"É essa coisa, esse medo da morte, esse medo de morrer antes de alcançar o que desejamos ou de ver nossas crianças crescerem. Isso é o que te atormenta."

"Mas como eu desejaria pensar em algo tão depressivo?"

"Pessoas ricas no Ocidente, eles nunca tocaram em corpos mortos, feridas frescas, coisas podres. Isto é um problema. Essa é a condição humana. Nós precisamos estar prontos para o momento de deixar de existir."

Lugares, como pessoas, têm um jeito de nos impressionar, desde que estejamos abertos à possibilidade de surpresa e não presos em noções preconceituosas. O reino Himalaia é melhor conhecido por sua inovadora política da Grande Felicidade Nacional; é uma terra onde o contentamento supostamente reina e a tristeza é proibida. Butão é de fato um lugar especial (e Ura, diretor do Centro de Estudos de Butão, uma pessoa especial), mas cuja especialidade é mais matizada e, francamente, menos radiante que a sonhadora imagem de Shangri-La que nós projetamos nele.

Na verdade, sugerindo que eu pensasse sobre a morte uma vez por dia Ura estava sendo leve comigo. Na cultura butanesa, é padrão pensar na morte em torno de cinco vezes ao dia. Seria digno de nota para qualquer nação, mas especialmente para uma tão bem classificada em questão de felicidade como Butão. Seria esta, secretamente, uma terra de escuridão e desespero?

Não necessariamente. Algumas pesquisas recentes sugerem que, ao pensar na morte com bastante frequência, o butanês não o faz sem razão. Em um estudo de 2007, os psicólogo da Universidade de Kentucky, Nathan DeWall e Roy Baumesiter dividiram algumas dúzias de estudantes em dois grupos. Um grupo foi ordenado a pensar sobre uma dolorosa visita ao dentista enquanto o outro grupo foi ordenado a contemplar a própria morte. Depois, ambos os grupos foram ordenados a completar palavras-chave, como "jo_". O segundo grupo - aquele que pensou sobre a morte - estava muito mais propenso a construir palavras positivas, como "joy" (alegria, júbilo, em inglês). Isto levou pesquisadores a concluir que "a morte é um fato psicologicamente ameaçador, mas quando as pessoas a contemplam, aparentemente o sistema automático começa a buscar por pensamentos alegres".

Estou certo de que nada disso surpreenderia Ura ou qualquer butanês. Eles sabem que a morte é parte da vida, queiramos ou não, e ignorar sua verdade essencial tem um custo psicológico bem pesado.

Linda Leaming, autora do maravilhoso livro A Field Guide do Happiness: What I Learned in Bhutan About Living, Loving and Waking Up, sabe disso também. "Descobri que pensar na morte não me deprime. Faz-me apreender o momento e ver coisas que eu não teria visto ordinariamente", ela escreveu. "Meu melhor conselho: vá. Pense o impensável, [pense] muitas vezes por dia aquela coisa que atormenta você".

Diferente de muitos de nós no Ocidente, os butaneses não sequestram a morte. A morte - e as imagens da morte - estão por toda a parte, especialmente na iconografia budista, onde você encontrará ilustrações coloridas e macabras. Ninguém, nem mesmo as crianças, é protegido destas imagens, ou das danças rituais que reencarnam a morte.

O ritual providencia um recipiente para o pesar, e em Butão esse recipiente é grande e popular. Depois que alguém morre, há um período de 49 dias, pela manhã, que consiste em elaborar, cuidadosamente, rituais orquestrados. "É melhor que qualquer antidepressivo", contou-me Tshewang Dendup, um ator butanês. Os butaneses podem parecer isolados nesses tempos. Eles não estão. Eles estão de luto através do ritual.

 Por que uma atitude diferente com relação à morte? Pensa-se que o butanês pensa sobre a morte só porque ela está por toda parte em torno deles. Para uma pequena nação, ela oferece muitos modos de morrer. Você pode encontrar sua morte nas sinuosas e traiçoeiras estradas. Pode ser atacado por um urso; comer cogumelos venenosos; ou morrer de exposição.

Outra explicação são as profundas crenças budistas, especialmente a reencarnação. Se você sabe que terá outra vida, temerá menos o fim dessa vida particular. Como dizem os budistas, você não deveria temer a morte mais do que o descarte de roupas velhas.

Não quer dizer que os butaneses não experimentam medo ou tristeza. Claro que eles as têm. Mas, como Leaming me contou, eles não fogem destas emoções. "Nós no Ocidente queremos remediar se estamos tristes", ela disse. "Tememos a tristeza. É algo a ser ultrapassado, medicado. No Butão há aceitação. É parte da vida."

O ensinamento de Ura, por enquanto, está comigo. Tornei regra pensar sobre a morte uma vez ao dia. A menos que eu esteja especialmente estressado, ou tragado em um medo inexplicável. Pois daí eu passo a pensar nela duas vezes ao dia.

via BBCtravel

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